domingo, 15 de fevereiro de 2015

Foi Assim, há Trinta e Dois Anos


Ela estava tão grávida, tão grávida, que a qualquer momento poderia dar à luz.

Meses antes, numa madrugada de verão, passara duas horas a olhar para um tubo de ensaio, colocado sobre um suporte de madeira ou plástico castanho, à espera de lhe ver aparecer no fundo, um círculo vermelho.

Sim, era um círculo vermelho no fundo desse tubo de ensaio, que lhe iria dizer se dentro dela existia vida a crescer.

Finalmente o círculo tão esperado apareceu, e nesse momento, nesse preciso momento, sentiu o coração anunciar-lhe que aí, começara a viver.

Era a primeira vez que ia ser mãe. E para ela, era tão importante ser mãe!

Com a doçura do seu estado de graça, sentia o ventre liso a pouco e pouco tornar-se saliente, enquanto um novo ser crescia nas suas entranhas e começava a ser-lhe vida e amor. Esse amor que não tem nome, que não pode ser definido pela palavra formada pela junção das letras: a-m-o-r, porque há sentimentos que transcendem a condição humana. Logo não podem ser traduzidos nesta dimensão.

A chegada do seu bebé, ficara prevista para a terceira semana do mês de Fevereiro. Entretanto, ela ia-se deliciando com os movimentos que cada vez se tornavam mais específicos dentro de si, e que a levavam a adivinhar partes do corpinho desse ser tão amado que brevemente iria poder sentir nos braços.

Seu pai, também nascido no mês de Fevereiro, desde o primeiro instante em que lhe fora anunciado que ia ser avô, sempre dissera:
"-Vai ser uma menina e nascerá no dia dos meus anos" . Frase que lhe ficou marcada na memória para sempre, e que a faz pensar como toda e qualquer intenção de amor, pode ditar uma vida.

Há trinta e dois anos, era terça-feira de Carnaval, foi também com o coração repleto de amor que ela abraçou e beijou o pai pelos seus sessenta e três anos. Mas logo pela manhã, notara que algo se passava com o seu corpo. Nada que a impedisse de festejar o dia com muita alegria, cantar os parabéns e comer bolo.

Depois...depois, cumpriu-se o que o amor ditara:

Eram vinte horas e trinta e cinco minutos, o seu ventre inchado transformou-se em vida.

Deu á luz uma menina, pesava três quilos seiscentos e cinquenta gramas e chamou-lhe Ana.

Não lhe conseguiu ouvir o primeiro choro, e o primeiro afago recebeu-o do pai, que vivera intensamente cada segundo desta gravidez, também sua.

O primeiro colo recebeu do pai, que estava lá, quando involuntariamente o da mãe foi forçado a falhar.

Estávamos no dia 15 de Fevereiro de 1983.

Obrigada minha filha, por me teres tornado mãe. Por nos teres tornado pais!

Muitos beijinhos de Parabéns pelos teus trinta e dois anos , com todo o amor e orgulho que sentimos por ti.

E nunca te esqueças:
É no brilho e na luz que o amor flui e se faz vida. É nos recônditos da alma que a felicidade se instala.


* Parabéns meu pai , farias hoje noventa e cinco anos... onde quer que estejas, sei que estás feliz por nós.



*Ah... e ela gostou tanto da experiência, que a repetiu por mais três vezes...




sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Inquietação


Há uma voz ameaçadora
que me cega o peito,
há um querer ver 
para além dos olhos
o pó que transporta o vento.

Há um crescer da fome 
com que os lábios sangram 
ao toque do beijo,
sempre que vejo, 
hastes que me saem do ventre
e se elevam ao céu 
em suplicas de ansiedade.

Quando a última lua 
se abrir nos meus olhos,
contar-te-ei a verdadeira cor das estrelas
e nelas pousaremos as mãos repletas de vida.

Unidos semearemos bondade,
da terra eliminaremos o desalento.

Tu serás o pó, eu serei o vento...




(eu)


Imagem- Lauri Blank