E porque acho que o que é belo deve ser partilhado, com a devida autorização do autor, deixo aqui mais um texto de António Cebola. Com quem tenho o privilégio de estar casada, há quase trinta e dois anos...
Ouroboros
“Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.”
Fernando Pessoa
(Para que conste: és um produto do Quarteirão do Escritor, e eu sou o teu Criador.)
Queria-te belo e formoso. A minha Dafne transfolheada de loiro.
Imaginava-te dúctil, subserviente. Moldável e fluido. Vertido duma torrente irreprimível, caudalosa.
Sonhava-te exótico, desenhado com linhas árabes, siamesas, kanji, ou sânscritas. Reinventava-te permanentemente, adornando-te com oximoros, prosopopeias e quejandos.
Desejava-te sage e letrado. Reflexo de todas as ciências e de todas as artes que te precederam, e das que habit (-áram; -am; -arão) outros espaço e tempos. Resplandecência virtuosa.
Mas não aceitaste a tua condição de criatura. Aspiravas a voos mais altos: querias ser, também, criador. Rebelaste-te contra a força do punho que te queria plasmado na folha imaculada. Desprezaste as oferendas – meras especiarias – que poderiam temperar o teu corpo e embriagar o espírito dos homens. Estancaste a corrente criadora e inverteste-lhe a direcção. Ousaste interrogar-me.
Podias ter sido um conto: não vales um tostão: exibes-te pedante e cabotino, iletrado e ignaro.
A substância da obra ficou aquém do sonho da ideia. Renegaste a imortalidade. Repudio-te. Morreste-me.
Exauridos, chegámos ao
FIM
(a folha seguinte está, outra vez – teimosamente –, em branco)
Minha querida
ResponderEliminarO que é bom tem de ser mesmo partilhado, e este texto é sublime.
Um beijinho com carinho
Sonhadora
Não há morte nem princípio
ResponderEliminarum texto com muita qualidade literária.
ResponderEliminare a folha seguinte estará sempre em branco, à espera de ser teimosamente escrita.
gostei muito do texto do António Cebola.
beijinho
:)
reitero, estimada Cristina, o que já aqui disse, na oportunidade: o seu esposo (tal como a Cristina). prima por uma escrita inteligente, culta e, simultâneamente, laivada de um lirismo metafórico que me acrescenta.
ResponderEliminarvir aqui lê-los, a ambos, e por conseguinte, tornou-se caminho obrigatório nos meus tempos desobrigados de trabalho.
a ambos o meu enorme Obrigada.
fraterno abraço
Mel
Nunca há um fim, a vida é feita de reinícios.
ResponderEliminar(Há sempre uma folha em branco que espera por nós)
Cativaram-me imenso os meandros da escrita do António. Parabéns!
Magnífico, na forma e no conteúdo.
ResponderEliminarTem um bom fim de semana, querida amiga Cristina.
Beijo.
Uma criação original e bela!
ResponderEliminarGostei desta partilha, amiga Cristina.
Beijinho.
Um texto magnifico. Um conteúdo pleno de interesse.
ResponderEliminarBelíssima esta partilha. Óptima escolha. Parabéns
Bom domingo
Bjgrande do Lago
Olá, querida Cristina!
ResponderEliminarComo está/ão?
Li, o texto do António, seu marido, já há dias, mas sem tempo para o comentar, nem me atrevi a tamanha façanha. Hoje, de novo, e com mais tempo, "meti mãos à obra" e encontro sempre nele cambiantes, perspetivas diferentes e muita dificuldade em fazer um juízo de valor sobre este tipo de escrita. SERÁ POSSÍVEL?
Não sei interpretar, e muito menos avaliar a riqueza destas palavras, uma melhor que a outra, pode ter a certeza. Se eu dissesse excelente na forma e no conteúdo, estava tudo simplificado, mas eu que não sei exprimir-me, assim!
A prosa aqui apresentada é muito rica, indiretamente, objetiva e subjetiva, mas assentando sempre numa trave mestra, chamada TALENTO.
Digo-lhe, também, que a mesma não é de fácil interpretação, mas quem a escreveu sabe o que escreveu e para quem a escreveu. Nós, "simples mortais, que escrevemos", não chegamos lá, facilmente.
Tive de consultar o dicionário, por não saber o significado de alguns vocábulos, e há uns, que podem, como sabem, ter mais do que um significado. Assim, tive, de integrar no texto, aquele que me parecia mais óbvio e lógico. DEU-ME TRABALHO, MAS TAMBÉM ME DEU PRAZER.
Penso que é um texto CRÍTICO de amor universal, dedicado ao Homem, na grandiosidade que dele se esperava, e que ele não soube ou não quis aceitar, isto é, não acolheu a sua "condição de criatura".
TODOS QUEREMOS SER ÍCAROS, MAS O SOL DERRETE-NOS, E MORREMOS PARA NÓS E PARA OS OUTROS. É O FIM QUE, UM DIA, SERÁ INÍCIO, DE NOVO, EM MINHA OPINIÃO.
Um agradável domingo.
Beijos para ambos.
Cristina e António,
ResponderEliminarEsqueci-me de frisar, chamar a atenção, para a significativa imagem que encima o texto.
SOMOS TUDO E SOMOS NADA. ESTAMOS À MERCÊ.
Beijos da Luz.
boa semana.
ResponderEliminarobrigada pela visita!
beijo
:)
Olá Amei a forma de expressão! Adorei o blog todo, inclusive! abraços
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