Partimos,
como se não houvesse amanhã
em direcção à luz do sol fervente
sufocados pelo ar.
Tinhas os olhos tristes e empoeirados,
na garganta fragmentos cinzelados
que te impediam de respirar.
Impulsionei-te o corpo
para que conseguisses ultrapassar
aquela tenebrosa repleta de matéria orgânica
e lixo planetário
a deambular por entre sombras ameaçadoras,
enganadoras airosas
da grande árvore de hastes venenosas,
como cascavéis de língua pontiaguda
e barriga entumescida, prontas a atacar.
Elevaste-te, e deixaste para longe a amargura,
atrás ficaram cães raivosos, babados
que se atropelavam e cravavam dentes
em carne enrubescida e desprovida
de pele que lhe servisse de armadura.
O vento transportou-nos até ao ponto sagrado,
onde a partida coincide com a chegada,
e a viagem é uma linha imaginária
onde podemos desenhar a eternidade.
Chegámos,
e enfeitaste-me os cabelos
com os primeiros raios de sol,
naquele lugar onde a poeira parecia luzidia,
e com a mente esvaída de qualquer lembrança
açoitada pelo véu da esperança,
fizeste-me sentir amada à luz do dia.
Não mais sentimos medo da fera desvairada,
estendemos os corpos sedentos
sobre intermináveis estrelas
e acordei-te de um pranto sonhado em terra molhada
Da ilusão restou :
este desejo que em mim ficou
de subir tão alto, tão alto,
até onde as formas se diluem,
os sons se dissipam,
as cores se desvanecem...
Como se tudo o que se vê lá em cima,
não pudesse ser contado cá em baixo.
(eu)
Imagem-Lauri Blank